quarta-feira, 26 de novembro de 2014
Eu só tenho pena de ti
Eu tinha 11 anos quando nascestes. Asilada por causa de um amor traiçoeiro, Não tinha casa nem lar. Tu tinhas casa, mas não tinhas lar. Teu enxoval era de roupas encardidas pelo uso As únicas coisas novas que tinhas, eram os casaquinhos de lã feitos pela tua avó, nas longas noites de frio e sofrimento. Teu berço ficava entre a parede e o peito da tua avó, que mal se mexia por medo de machucá-lo. Não fostes amamentado, e era eu quem fazia tuas mamadeiras e depois tuas papinhas Tu me ensinaste a trocar fraldas, a testar a temperatura do leite na mão, a embalar para ninar. Contigo dei meus primeiros passos na minha história de mãe. Quando estavas com oito meses, fomos embora, em busca da felicidade que nunca veio. Depois teus pais nos seguiram, mas, tu ficaste com a outra avó, tão carinhosa, como a primeira. Quatro anos se passaram, até que novamente te tive nos braços. Eras tão carinhoso! Adorava, quando chegava da escola e vinhas correndo ao meu alcance e enlaçavas minhas pernas. Adoravas ficar no meu quarto enquanto eu estudava. Ficavas quietinho na minha cama, me olhando com adoração. E eu te olhava com adoração! Eras o meu pequeno príncipe. Assim, passaram-se seis anos. Brincávamos, ríamos, jogávamos, rolávamos no chão e eu te abraçava apertado e tu te aconchegavas no meu abraço. Depois disso, partistes e só te via eventualmente, mas, o meu amor era o mesmo. Aos 17 anos, sem nunca ter tido um lar na tua casa, perdestes a casa também. Já não te queriam. Eu te abriguei. Dei-te tudo que te fora negado. Dei-te carinho, dei-te amor, dei-te uma família. Durante um ano, voltastes a ser o menininho que me esperava no portão todos os dias e enlaçava minhas pernas num abraço amoroso. Voltastes a sorrir, brincavas como o menino de outrora, eras feliz. Nos teus 18 anos, ganhastes a carteira de motorista. Como ficaste feliz. Sentias-te um homem! Mas, novamente, tivestes que partir. E depois desta derradeira partida, não sei em que momento te perdi. Esquecestes todo um mundo de afeto e te apegastes a ídolos pagãos. Pessoas que nunca te quiseram nunca te acarinharam nunca te deram um lar. Tua avó que já não podia fazer casaquinhos de tricô para te agasalhar do frio que a vida te oferecia, morreu tendo tua foto a sua frente. Nunca entendendo o porquê de já não estares ali, deitadinho entre a parede e seu corpo, com o único calor que conhecestes nos teus primeiros meses. Eu, mais feliz que ela, pude chorar a tua morte no meu coração mesmo sem entendê-la. Todas as palavras que te disse com carinho, todo o amor que te doei ao longo dos anos, tu me devolvestes em forma de injúrias, calúnias e desapego. Com o beijo de Judas, traístes quem mais te amou. Por isso, eu não tenho pena dos Josés, dos Joaquins nem das Marias. Eu só tenho pena de ti!
(Escrita por Carmen Mattos)
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