sábado, 31 de janeiro de 2015

Caminhar nas nuvens


Sentada na cadeira escondida na pequena varanda daquilo que ela chamava de lar, passou o dia a refletir sobre tudo o que havia feito.
Sobre os tropeços e como o havia magoado de forma tão súbita e desnecessária. 
Ela se sentia culpada e aquilo a feria todo o instante em que imaginava que poderia perdê-lo naquela noite fria de verão.
Sabia que toda a compreensão que residia dentro do coração puro dele um dia não resistiria à falta de jeito que ela tinha ao lidar com as situações que lhe pareciam tão difíceis.
Mas era tudo tão simples...
Sabia que tinha errado ao trazer o passado à tona e sabia que precisava mudar. 
"Ele foi a melhor coisa que me aconteceu nos últimos tempos", repetia baixinho se lembrando da forma que ele a tratava e lhe trazia paz.
Se pudesse voltar à noite em que tudo se despedaçou, aprenderia a caminhar nas nuvens de olhos fechados.
Entretanto as pedras que por tanto tempo feriram seus pés a fizeram fugir da realidade mágica que aconteceu naquela noite de verão.
Dentre tantos arrependimentos, ela rezava baixinho para que o céu lhe fosse devolvido.
Fez uma promessa aos anjos que iluminavam sua mente e assim esperou. 
Em uma noite de verão esperou quieta, de mãos amarradas frente àquilo que não estava mais em suas mãos, nada mais que o céu.
Onde finalmente aprenderia a andar nas nuvens de olhos fechados...

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Que o medo não vire rotina


A primeira briga, aquela mais cruel porque não existem cuidados para não machucar o outro justamente por inexistir a compreensão total daquele que jaz em tua frente.
Um divisor de águas daquilo que pode dar certo ou se perder no meio da tempestade.
E assim passaram-se horas, no aconchego que deixou de existir por um momento de insensatez.
Quando digo que gosto de ti, minhas palavras não são em vão e tampouco existe a vontade de te deixar partir.
Quero-te perto, tão perto quanto meus braços possam te abraçar e te deixar sem ar, no momento de entregação.
Que os medos não virem rotina e que as palavras sussurradas ao pé do ouvido façam valer cada minuto, cada momento.
Porque na tua voz e nos teus braços eu encontrei a paz.
Um peito aberto para me aceitar como for.
Esquecendo desta primeira briga, que no calor das emoções deixou de existir.
Restando tão somente aquilo tudo que construímos juntos, lado a lado, de mãos dadas.
Enquanto apagamos os resquícios desta noite vazia...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Pena de ti



Eu tenho pena. 
Pena de ti que não és coisa alguma, além da vida que te cerca que inclusive não é tua.
Pena dos teus sorrisos melancólicos e de todas as vezes te fizestes de contente para esconder a dor que carregavas no peito.
Eu tenho pena.
Pena de ti que com inveja do mundo tentou roubá-lo só para ti, momento em que te vistes no meio de um buraco cavado com tuas próprias mãos.
Eu tenho pena.
Que de flor só te resta o nome, dentre atitudes tão frias e mesquinhas.
Eu tenho pena.
Que das mentiras deslavadas que contastes tentando jogar a culpa em mim pelos teus atos, não acreditavas que a verdade já havia sido espalhada antes mesmo de eu te cobrar satisfações.
Não saberia prever o futuro, portanto a verdade restou jogada aos 4 ventos antes mesmo de tuas mentiras.
Eu tenho pena.
De teres perdido a única família que te acolheu, de forma tão súbita, tropeçando nos teus próprios erros.
E por mais que tentes me derrubar e inventar mentiras, continuo no topo com meu olhar de pena.
Pois tudo o que sinto agora é pena de ti.
Por tudo aquilo que não és e tudo aquilo que jamais serás...

O dia em que morri



Na penumbra do corredor cinza por onde as janelas só traziam mais escuridão, eu caminhava em passos largos e trêmulos. Andava, olhando as portas, a procura do número que queria e temia. Naquele local gélido e solitário, só a minha respiração era ouvida. Numa da mão trazia minha mala e com a outra mexia em meus cabelos somente para não deixa-la a longo do corpo.
Agora diante do único obstáculo que me separava do desconhecido, não sabia o que fazer. Ordenava aos meus pensamentos, aos meus sentimentos e a toda minha alma: Sê forte! Forte? Forte contra o quê? O que me esperava? Eram verdadeiros meus temores? Uma vida inteira se passou enquanto minha mão descia de meus cabelos e se agarrava à maçaneta. Foi preciso outra vida para que eu pudesse girá-la abrindo a porta.
O branco agressivo, em contraste com o cinza do corredor, me paralisou e meus olhos se fixaram em outros olhos ali na minha frente. Olhos opacos, sem vida, sem razão de ser e por defesa, deixei de encará-los e baixei meu olhar para seus lábios. Não havia cor, rachaduras molduravam um tímido sorriso de dor. Não dessas dores de chorar, de gritar, de tomar remédios, dor que vem de dentro e vai destruindo o espírito até consumir também com o corpo. Dor que não dói porque amortece todos os sentidos até sua própria dor. Eu lhe sorri em retribuição. De qualquer jeito, joguei minhas lágrimas e meu grito para dentro de mim e, lhe sorri. Meus olhos ainda vagavam pelo seu corpo enquanto eu me mantinha congelada no umbral da porta.
Vi seus ralos e loiros cabelos espalhados desordenadamente pelo travesseiro. Seu braço direito estendido ao seu lado deixava ver sua mão tão pálida quanto à rudeza dos brancos lençóis. Pude ver as veias muito azuis de sua mão, as unhas arroxeadas e estas eram as únicas cores de tudo que via. Larguei a mala ali mesmo na porta e fui abraçá-la temendo que se desmanchasse ao meu simples toque. Beijei sua testa e a enlacei em meus braços. Não chorei. Fiquei ali abraçada ao seu corpinho frio passando todo o calor que tinha comigo e meu único pensamento era que nada nem ninguém iria tirá-la de mim. Brigaria com Deus, com a morte e quantos mais aparecessem a minha frente, mas, NINGUÉM iria tirá-la de mim.
Aos poucos fui me afastando e ela na sua voz quase inaudível me disse: estou bem, mãe. Sorri novamente em concordância e fui ouvindo as coisas que tinha para me contar. Falava com voz macia, entrecortada pela dificuldade em respirar, e eu petrificada com o horror do seu estado, ouvia a tudo como se tudo fosse nada. Sem saber de onde saia minha força, conseguia ouvir, sorrir e acariciar sua mãozinha. Quando de repente, já esgotada parou de contar sem ter tudo contado. Fiquei ainda alguns instantes só olhando-a e fui tomar banho.
Tão logo a porta se fechou atrás de mim, minha armadura virou pó, o sorriso se transformou numa careta e as lágrimas escorriam abundantemente pelo meu corpo. Vagarosamente tirei minha roupa e fui esconder minha dor no barulho da água que caia do chuveiro. Rezei até ficar rouca enquanto a água tentava inutilmente lavar o meu desespero. Pedi a Deus que não fizesse com que eu enterrasse uma filha minha. Pedi a Deus uma cruz mais leve. Pedi a Nossa Senhora que me desse à coroa de espinhos, o açoite, a traição ou a morte, mas que não me desse à dor de entregar-lhe minha filha. Lembrei-me da alegria da sua chegada, dos primeiros passos, do seu sorriso aberto, dos seus olhinhos de chinesinha, da responsabilidade dos seus atos, da integridade do seu caráter, das noites sem fim de estudos, da sua paixão pelo flamengo, pelo nosso acordo de só poder faltar à aula no dia seguinte da apresentação do Oscar, sua outra paixão. Lembrei de todas as suas lutas, de todas as suas vitórias, de todas as suas mágoas que sempre tentava esconder de mim e que raramente tinha sucesso. Lembrei do seu jeito quietinho de ser, da meiguice, da solidariedade, lembrei, lembrei,lembrei, lembrei de tudo que nunca esqueci. E no meio de tantas lembranças, lembrei de novamente pedir para mim a punição: “Faça de mim o que Quiseres, mas livre minha filha de todo o mal.”.
Depois disso, juntei os cacos do que fora eu e retornei ao seu lado, pronta para guerrear contra o invisível, o inimaginável e vencer a todos. Por três dias e por três noites fiquei de vigília até convencer-me que o mal havia sido afastado. Após este tempo de guarda, as coisas foram lentamente tomando seu lugar, mas a ferida deixada no meu peito nunca cicatrizou e ainda tenho e terei para sempre a marca do dia em que morri.

Carmen Mattos

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Drama


Queria poder escrever tudo que se passa comigo neste instante, mas meus pensamentos confusos não conseguem se transformar em palavras.
Num redemoinho de lembranças, tudo roda e perco-me na intenção de entender.
Lembro da minha infância e tanto teria para escrever sobre ela; lembro-me da adolescência perdida no objetivo de ser; lembro-me das filhas, das decepções de hoje e de outrora; lembro-me da ausência de bem querer.
Qual destas lembranças me aflige neste momento?
Passado distante, passado recente, presente ou futuro? Queria escrever sobre a aflição que me aperta o peito, mas sequer consigo identifica-lo e então como descreve-lo escrevendo-o?
Talvez pegar o carro e sair sem rumo, mas de que adiantaria? 
Uma hora terei que parar e na volta inevitável mil explicações do inexplicável. 
Essa angústia faz com que o tempo pare e o tic tac do relógio seja na verdade as batidas do meu coração.
Mas como poderia, se meu coração bate acelerado e o relógio é tão lento?
Quem sabe eu esteja trocando os sons, e seja o tic tac do relógio mesmo, e meu coração de tão triste, tenha se calado e eu não o possa ouvir.
Sim, acho que é isso mesmo.
Calo-me, não por não ter o que falar, mas sim por ter muitas coisas encobertas na vazão do meu querer, e sem poder liberta-las, acorrento-as no meu silêncio. 
Falar é não ser ouvido.
Ninguém quer entender coisas que de tão velhas e banais perderam a razão para serem ouvidas. 
O tempo é precioso e não pode ser gasto com mofos e bolores de passado, tão passado que nem mais passado é. Quanto disso tudo é verdade e quanto disso tudo é drama, como diz minha filha? 
Será que minhas lágrimas fazem parte do passado ou do drama? 
Será que tanto chorei e me escondi de mim mesma, por teatro demodé? 
Se tudo é falso, também eu sou falsa e estou perdida nesse tempo de coisas reais. 
Talvez nem exista. 
Talvez seja somente parte de um pensamento de alguém que, neste momento, não sabe que eu também sou parte dela.
Talvez esta pessoa nem tenha angústias e neste caso as minhas angústias também seriam fantasias da fantasia dela.
E se eu não for eu e sim uma idéia tão somente? 
E se tudo não passar de atos e fatos que giram num redemoínho de pensamentos, como as coisas que sinto girar na minha cabeça?
Se assim for, não preciso pegar o carro e sair a esmo, não preciso escrever sobre minhas angústias pois elas são o pó que permite ao redemoinho existir e portanto precisam estar aqui para que tudo não se termine e o ciclo se mantenha.
Por que seria importante manter o ciclo?
Talvez se a angústia ceder, o redemoinho parar, as coisas que estão contidas nele caiam e se quebrem na queda.
E que coisas seriam estas? 
Quebra-las, quebraria um ciclo ou quebraria o todo?
E se o todo for o próprio redemoinho, e este o ciclo, e o ciclo a angústia, e a angústia os pensamentos, e os pensamentos o passado, e o passado o mofo, e o mofo o drama?
A vida seria o mofo do drama e por ser drama nunca existiu, e nunca tendo existido não poderia ter mofo, que é a vida em sua forma velha, gasta, perdida,e envelhecida. 
É!
Meus pensamentos não existem e por isso não consigo falar sobre eles.
Não estão acorrentados no meu silêncio como pensava, é o meu calar que prende o meu silêncio.
Assim quieta, não haverá quem conheça o meu drama e poderá viver o seu próprio drama, sem que eu possa interferir no seu sonho de ator da sua própria vida.

Carmen Mattos

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Perdi um amigo



Perdi um amigo.
Não daqueles amigos que se encontra sábado à noite num barzinho para tomar uma cerveja e jogar conversa fora.
Perdi um amigo que se encontra no coração sem que seja preciso a presença física, o abraço ou contar-se um conto.
Nunca veio na minha casa e nem nunca fui à sua, mas mesmo assim era amigo.
Quando me tornei sua amiga?
No dia em que o conheci.
Fui a sua rádio colocar um anúncio e lá estava ele com um sorriso aberto, um aperto de mão forte, que só as pessoas de bem tem. Depois de feito o trato comercial, foi mostrar-me a “sua rádio”.
A sua rádio era uma pequena sala, não muito clara, sequer bonita, mas mesmo assim seu peito se enchia de orgulho ao apontar cada detalhe, cada cantinho, daquela pecinha meio sem graça. 
Entendi muito pouco ou quase nada e não sei se isso se deve ao fato de ser totalmente leiga neste assunto ou por ter me perdido na sua alegria. 
Era um homem que sonhava.
E como admiro as pessoas que sonham!
Sonhar é ver além, ver o abstrato, é ver a esperança, antes que a esperança nasça.
Não tive tempo de conhecer seus defeitos, suas mágoas, suas tristezas ou feridas, mas muito mais importante que tudo isso, pude ver o brilho dos seus olhos quando se referia à pequena e modesta rádio.
Acho que este brilho no olhar era tão intenso que conseguia se transformar em ondas e chegar às casas das pessoas, principalmente as mais humildes, que tanto precisam de sonhos mesmo que os sonhos sejam emprestados, 
Um quadradinho pequeno, modesto, sem nenhum glamour, mas iluminado por um homem que sabia sonhar. 
Mas sonhar tem seus inimigos: a cobiça, a inveja, a malícia e tantas outras artimanhas que os homens se utilizam para tornar pequena a grandeza que não conseguem agarrar; a grandeza que é a pureza de ainda saber sonhar.
E foi assim que o homem que sonhava se foi. 
Não, ele não morreu. 
Ele só está seguindo a luz que seu sonho traça pelo firmamento.
Ao meu amigo, que nunca veio a minha casa e que eu nunca fui a sua, eu desejo, esteja onde estiver que nunca se esqueça de sonhar.

Carmen Mattos

Regeneração



Diz-se que a estrela do mar tem o poder de regeneração. Se lhe cortam uma das partes, com o tempo e o ambiente perfeito, ela reencontra energias e volta a brilhar em toda a sua perfeição.
Sempre que alguma coisa tenta me derrubar e o universo vira de ponta cabeça, visto-me de estrela do mar e participo do seu processo de regeneração.
Tornou-se automático e já nem sinto a dor da perda, quando a perda passa a não significar nada além de um pedaço meu que, em um ato de confiança, depositei em outra pessoa.
Interessante o quanto, no decorrer da vida, a gente se doa aos outros sem pretender receber nada em troca.
Impressionante é quando realmente não recebemos nada em troca, inclusive o respeito.
Vejo pessoas reclamando da vida e dos relacionamentos ruins e quando penso nisso, lembro do poder que cada um carrega dentro de si mesmo.
“Eu estou bem”, penso com a certeza de dias melhores.
Conheço a lei do universo de que atrais para si mesmo aquilo que entregas nas mãos dos outros e por isso, jamais, entreguei nada mais do que o melhor de mim.
E quando a vida me decepciona e a facada no peito dói, lembro que a maré leva embora todo o lixo soterrado na areia para voltar com água límpida, cristalina e a calmaria que tanto busco.
Até lá, continuo cultivando aquilo que tenho de melhor, sentada na beira do mar, esperando pelos dias mais calmos, longe de todo o lixo que invadiu minha vida e fez bagunça para que pudesse recomeçar.
E todo o recomeço traz consigo a esperança de que nenhuma parte seja tirada, até o dia em que não será mais necessária regeneração e nem a súplica por um respeito que não existe.


domingo, 25 de janeiro de 2015

À tua imagem



Tua covardia me assustou em uma tarde de domingo.
Acreditava que eras muito melhor daquilo que me mostrastes.
Pensei que tudo fosse mudar e que tomarias consciência de si mesmo ou que olhasse a própria imagem daquilo que te tornastes no espelho.
Mas hoje acredito que a imagem seria apavorante, assim como as marcas que carregas em teu corpo tão vazio de vida.
E assim, no meio das desculpas que jamais encarei como verdades, deixei-te ir.
Em busca daquilo que seja igual a ti, um espaço vazio de vida e uma imagem aterrorizante do reflexo de si mesmo...


Ao tempo que te dediquei



Desculpe-me, mas, eu não te perdôo.
Desculpe-me, mas tua traição doeu demais.
Desculpe-me, mas as lembranças de tudo que fui para ti
Não permitem que as minhas lágrimas sequem 
Desculpe-me, mas eu te amei demais
Hoje sei que foi amor jogado ao léu
Desculpe-me, mas no meu total desapego 
Creio que não deveria ter te cuidado
Não deveria ter enxugado tuas lágrimas
Sentado no chão brincando de carrinho
Ter beijado teus machucados
Compensado o desamor de teus pais 
Com meu amor imensurável
Desculpe-me, mas já não tenho nenhuma piedade por ti
De tuas inúmeras horas de sozinhez
Quando brincavas de abandono
Queria poder voltar atrás e te deixar no escuro
Assustar-te com o bicho papão
Rir-me de teus desalentos
E não te dar a mamadeira que a tua mãe não amamentou.
Hoje o mundo girou e na gira deste mundo
Tua ficastes na escuridão da minha vida
E de lá nunca deverás sair.
O tempo passou, fui mãe de verdade
Fiz-te irmão das minhas filhas
Dei-te um lar
Dei-te carinho
Dei-te o mais doce de mim.
O tempo passou, hoje és pai
Tens filhas
E dá a elas o amor que aprendestes comigo
Fui a única professora que tivestes, na arte de amar
Tudo que sabes aprendestes comigo
Mas, agora estou te ensinando o desamor.
Desculpe-me, mas as lágrimas que caem da minha face
São as mesmas lágrimas que caem das faces das minhas filhas
Que um dia foram tuas irmãs porque assim eu queria
E também são as mesmas lágrimas 
Que um dia verei escorrer dos teus olhos
E pingarão naquelas que hoje amas.
Desculpe-me, mas não há perdão para a ingratidão.
Desculpe-me, mas te nego o direito de usar o amor que te ensinei.

Carmen Mattos

Sessenta segundos



A vida dela tinha um ritmo inesperado. Todas as vezes em que ela pensava que fosse desmoronar, pensamentos bons lhe surgiam na cabeça com a leveza da brisa em uma manhã de domingo. 
Era inconstante e isso fazia dela uma guerreira dentro de si mesma. 
Queria o mundo e o merecia.
Com alma doce e encantadora, fazia de seu universo um colorido na mistura do arco íris.
Tudo era uma questão de tempo, sabia sempre que seu peito doía e as pessoas viravam as costas.
Esse era o momento mais difícil.
Mas calmamente, escrevia no verso do papel toda a insatisfação que sentia e ali deixava morrer as dores que lhe oprimiam.
Era encantadora no modo de agir e de lidar com as adversidades. 
O melhor de si sempre foi dado e caminhava com a consciência tranqüila na certeza de dias melhores. 
Fazia disso um sonho continuo e se entusiasmava sempre que alguém lhe roubava um sorriso.
E de sorriso em sorriso, aprendeu a caminhar sozinha.
Com toda a certeza do mundo de que em algum dia, em algum momento da vida, todas as promessas feitas não se desmanchariam na folha do papel, junto com as aflições que lhe roubavam o fôlego, por um minuto.
Sessenta segundos de melancolia e toda uma vida de sorrisos soltos, na certeza que tudo um dia iria mudar...

sábado, 24 de janeiro de 2015

Borboletas no estômago


Ontem eu tive um sonho.
Com borboletas no estômago e uma vontade que não cabia no peito.
Palavras de que tudo daria certo e que poderia andar ao teu lado de olhos vendados conduziam-me neste misto de realidade e ilusão.
Olhando nos teus olhos, enquanto falavas baixinho aquilo tudo que dizias sentir, deixe-me conduzir na melodia que encantava os ouvidos.
Participei do teu mundo e, aos poucos, vi-me devorar nas ironias que se seguiriam.
Na minha ausência, chegava de mansinho e via-te junto àquela que tiraria teu sono, enquanto seguravas minha mão.
Lentamente, assim, tirei as vendas que me amarravam a ti e pude enxergar de novo com meus próprios olhos.
“Tola”, pensei enquanto te cobrava explicações para tudo o que estava acontecendo.
E o ruído do silêncio me deixou sem respostas.
Um ruído tão duro, quanto as pedras que pisei quando estava de olhos vendados, deixando-te me conduzir àquilo que não era mais sonho.
E sim, uma amostra de ti mesmo e de tudo o que não poderias me dar:
A segurança de caminhar junto a ti de olhos vendados, acreditando nas palavras que me conduziam ao abismo que era estar ao teu lado...


Covardia


Olhos arregalados,
Fitavam-me.
Respiração agônica,
Sufocavam-me.
Sudorese profusa,
Molhavam-me.
Teu medo,
Meu medo.
Tudo misturado
Numa receita de dor
Ir ou ficar?
Eu decidiria.
Meu medo de escolher errado.
Tu esperavas.
Teu medo que eu escolhesse errado.
Num vai e vem
De vida e morte
Nós esperávamos
Queríamos um sinal que nunca veio
Por que eu?
Por que tu?
Por que nós?
Vida irônica
A caçoar até o final.
E qual seria o melhor final?
Não há melhor.
Todas as escolhas nos fazem perder.
Perder o que nunca tivemos.
Estás cansada.
Estou parada.
Por que Deus não se mostra?
Por que exige que nós sejamos únicas responsáveis
De uma decisão indecisa
Não sei o que fazer.
Cansada de minha covardia
Viras o rosto para longe de meus olhos
E o fechas para que eu não veja tua última lágrima.
A lágrima que selará nossos destinos.

Carmen Mattos

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Livro da vida



Embalo nas páginas de um livro, uma história que não fala de amor e sim de histórias, e me encaixo cada vez mais no universo que me consome.
Por mais que ainda sinta os erros do passado, sei que não há como mudá-los e tampouco remediá-los, fato este que me faz seguir em frente.
Imaginando uma cena qualquer e sabendo que já seguistes em frente e virastes a página, não me resta alternativa além de desejar no fundo da mente que sejas feliz.
Há um mundo inteiro de possibilidades e não há razões para que não te deseje isto, nada além do melhor.
Não alimento ilusões, expectativas e nem sei se este seria o caminho ideal a seguir, quando a correnteza é tão forte que me atira em alto mar.
Brinco com a vida e com as estações nebulosas que, por vezes, abalaram a minha estrutura, mas nunca me fizeram naufragar.
Rio de mim mesma e sei onde reside o melhor, o que posso ter, estar e dar.
E me sinto feliz assim.
Onde o melhor de mim sempre irá residir naquilo que dei para todos que em algum momento me rodearam e isso me faz sorrir.
Sorrindo, brincando, rindo, encontro o embalo perfeito, nas páginas deste livro que ainda está tão incompleto, mas cheio de folhas para rabiscar...


segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Hora de voltar


A rua movimentada, de um lugar desconhecido, que ela facilmente poderia chamar de lar, lembrava que já era hora de ir embora.
A mala estava desfeita no quarto do hotel e ela não queria partir.
A distância de tudo que a matava lentamente, fazia-na esquecer do que já era passado e não tinha solução.
Nos dias que se passaram, absorvida pelo novo, ela já não tinha tempo de pensar em nada, inclusive nele.
O medo do retorno causava um espanto e uma triste melodia, que teria que lidar inevitavelmente.
Mas sabia que aquilo era passageiro e que, com o tempo, as coisas se ajeitariam.
Tomou esse tempo para pensar e ligou todos os pontos soltos, daquilo que, quando estava no olho do furacão, infelizmente não conseguia entender.
Tudo era tão simples, que não entendia o motivo de não ter compreendido toda uma situação antes.
Talvez o seu temperamento ruim, de quando não tinha paciência de perguntar, haviam feito dela uma prisioneira de si mesma.
Mas apesar da claridade da situação, ela não queria voltar.
Fugir do inevitável parecia ilógico, mas o inevitável a amedrontava, ainda.
Coletando todos os pensamentos que se encaixavam em sua cabeça ela sabia que era hora de partir.
Com a cara lavada, de peito aberto e toda a coragem que pôde reunir em si mesma, subiu, colocou seu melhor vestido, arrumou as malas e sorrindo voltou para aquilo que ainda era o seu lar...

Brisas


Enquanto abria meus olhos na escuridão, permiti-me questionar pela primeira vez se ainda penso em você.
Os dias foram corridos e não havia tempo de pensar em nada, além de mim mesma.
Havia tanta beleza ao meu redor e o perfume de rosas, misturado com o cheiro da brisa que invadia o mar em mais um dia de verão, trouxeram à tona momentos nostálgicos.
Talvez você não pertencesse a esse universo que escolhi como meu e que poucos se aventuraram.
Era tudo uma questão de tempo!
Percebi que o que havia me permitido era insano e em vão.
Fechei meus olhos e prometi a mim mesma não me permitir pensar em você.
E essa foi a única forma de eliminar os resquícios que habitavam em mim.
De olhos fechados sentindo a brisa do mar me permiti pensar em mim.
Meu rosto se iluminou de vida e já não havia o que me questionar.
Apaguei todas as palavras ruins que havias proferido em vão e sorri.
Debruçada em mais esse sonho bom...

domingo, 18 de janeiro de 2015

As lágrimas purificam a alma, lavando o resto de ti que estava grudado em mim.
Chorei até sangrar os olhos.
Para que então possa voltar a sorrir...

sábado, 17 de janeiro de 2015

Querido ex


Querido ex.
Eu ainda tenho tanto para te falar, mas tu não me destes a chance.
Sim, confesso que hoje impliquei contigo e testei os teus limites.
Confesso que tinha plena consciência disto e o fiz porque queria provocar uma reação que não fosse a indiferença ou manter a sensação de correr atrás de alguém que parecia não se importar.
Acreditava que tua postura de general uma hora caísse e tu soubesse distinguir trabalho da vida pessoal.
Conheci teu pior lado hoje, assim como conhecestes o meu.
Eu odeio a forma com que lidas com a vida e com as pessoas, sempre é ou não é, não existe meio termo.
Eu odeio a forma em que tu te fechas em teu próprio universo e nunca me deixou entrar.
Eu odeio o teu ciúmes reprimido que só conheci agora, daquela pessoa que sempre se mostrava presente na minha vida e que eu nunca percebi que te incomodava.
Se eu soubesse antes talvez teria tomado alguma atitude.
Mas saibas que quando tu reclamastes dos resquícios do meu outro relacionamento, eu  o apaguei para que não te machucasse e me deparei com fotos e momentos do teu antigo relacionamento.
Não achei justo.
Saibas que eu esperava apoio teu quando peguei o primeiro avião e fui atrás do meu sonho e tu te quedastes inerte.
Querido ex, quero que tu saibas que isto acabou comigo e afogou um pouco dos meus sonhos.
Como eu odiei a forma com que me tratastes quando te liguei para perguntar o que tinha acontecido e me tratastes como um soldado em campo de batalha, devendo obediência ao seu general.
Talvez tu não te enxergues assim, mas é assim que tu és.
O universo é teu e quem quiser que se adapte.
Neste momento perdi meu bom senso e transformei em rancor todo o amor que nutria por ti, no exato momento em que percebi que realmente não te importavas comigo.
Querido ex, que mesmo ex não deixa de ser meu querido, eu te liguei porque eu me importo contigo e no momento de desespero me vi despreparada para acompanhar tua vida sem que isto me afetasse e sem que eu sofresse dia após dia.
Não tive coragem de te ver mal e nem te fazer sofrer, por isto me atirei aos lobos e te provoquei para que tu me excluísse de tua vida.
Dei minha vida em sacrifício para não te ver sofrer, com o intuito de eu não sofrer ao ver que poderias ter me esquecido tão facilmente.
Pensei que tu me conhecesse o suficiente para entender isso.
Enganei-me.
Querido ex, quando eu vi uma coisa nova, quis te trazer por um segundo comigo e logo dei um jeito de te incluir junto a mim, nas dezenas de quilômetros que nos separam e isso aumentou ainda mais a tua ira, porque eu não te dei espaço.
Isto doeu.
Querido ex, eu odeio a forma literal que absorves tudo, esquecendo que a vida é muito mais colorida que isto e que tudo pode ter dois ou sabe-se lá quantos sentidos.
Querido ex, por mais que eu odeie tanto de ti, não consigo deixar de amar um pedaço que seja, uma cara ruim, uma briga ao telefone...
Não consigo não rir de quando falas sério demais comigo e não consigo não sofrer quando se ausentas.
Querido ex, deixastes bem claro que jamais deixarás de ser ex, por isto não tenho outra forma de te definir aqui.
Mas antes que termine todas as explicações, adianto-te que a viagem poderia ser melhor, meus sonhos poderiam ser melhor delineados e poderíamos ter vivido tanto juntos.
Querido ex, estas serão minhas últimas palavras para ti porque sei que por ora não sou bem-vinda, se é que um dia o fui.
Eu sempre vou continuar odiando a tua forma de não entender que quando eu brinco, brigo, incomodo com adjetivos duvidosos, na verdade estou demonstrando todo o meu amor, da forma mais espontânea que a vida pode dar.
Que eu aprendi muito contigo, mas que é hora de te deixar partir.
Sem saudades, sem lamentos, sem rancor.
E quanto ao amor verdadeiro que nutro por ti?
Tu já fizestes aquilo que era necessário para que, devagarinho, quase sem querer, faça-no adormecer e lentamente esquecer que exististes um dia.
Querido ex, enquanto as lágrimas banham meu peito enquanto escrevo estas palavras de arrependimento e honestidade, lamento a exatidão de tuas palavras e a fúria que demonstrastes através delas.
Lamento também todas as minhas atitudes que se transformaram nisto que vivemos hoje.
Querido ex, se eu pudesse voltar no tempo voltaria, e tu lentamente deixaria de ser ex e passarias a ser o meu eterno implicante general, que muito tem para me oferecer e eu tão pouco reconheci o teu valor.
Querido ex, desculpe-me se te machuquei um dia e me desculpe por ter entrado na tua vida.
Talvez eu tenha estragado tudo ao exigir muito mais do que poderias me dar, ao te provocar propositavelmente ou pelo simples de fato de termos algum dia nos conhecido.
Por fim, querido ex, eu não consigo odiar nenhum pedaço de ti mesmo e só consigo amar cada dia mais, carregando a dor desta separação sozinha, assumindo toda a culpa, sabendo que tudo o que me resta é aceitar e seguir em frente.
Com o coração em pedaços, chamando-te de ex em pensamentos, enquanto queria te ter apenas mais alguns segundos ao meu lado...
E estas são todas as explicações que jamais me deixarias dar, meu eterno querido (ex)...

Louca



Desdentada e maltrapilha,
Ela anda, sem rumo,
Pelas ruas da sua vida.
Não tem para onde ir.
Não tem quem a espere.
Assim, desenganada,
Ri-se de si mesma
Como que louca fosse.
Olha os olhos dos transeuntes
E lembra-se que já foi um deles.
Não sabe há quanto tempo.
Também já não importa.
Agora, diverte-se com as ilusões.
Que um dia a vestiram,
Despindo-a de todas as venturas.
Foi tola, foi enganada e tripudiada.
Hoje escabelada e desdenhada
Faz-se de tola, engana e tripudia.
Seu jeito desajeitado de andar,
Falar, sorrir e dançar,
Fazem-na poderosa.
Pois não podem mais nada tirar-lhe.
Despida está de tudo que fora
E assim, louca, não a querem pilhar.
Encontrou, finalmente,
A liberdade de não ser importante
Para ninguém, a não ser a si mesma.

Carmen Mattos

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Anjos de papel


Dois anjos caídos do céu, na exatidão em que meus dias precisavam deles.
Anjos de papel, que se desdobram para me trazer ao rumo, para me trazer paz.
Sem asas, sem magia, anjos em forma de pessoas.
Que brigam, xingam e na constância do dia a dia se desentendem, comigo.
Eu tenho dois anjos de papel.
Almas nobres, tão peculiaridades dentro de si mesmos.
Um que se veste de paciência e segura minha mão sempre que é preciso.
Outro que se arma de rebeldia e se afasta sempre que se faz necessário para que nossas vidas voltem a se encontrar.
Eu tenho dois anjos de papel dourado, da cor mais nobre do espírito, onde o simples fato de existirem irradia luz que me contagia.
Protegem-me contra tudo que possa me ferir, incluindo eles mesmos.
Enquanto um me dá conselhos apenas dizendo que está tudo errado ou que eu fiz tudo errado, o outro se rebela e se afasta dizendo que tudo continua errado.
E me dão tempo para pensar...
Entretanto, sempre que nos afastamos, quase sem explicações, sinto o perfume no ar deixado na imensidão da distância causada.
E todas as noites, antes de dormir, eu agradeço pelos meus dois anjos, que mesmo feitos de papel, mesmo contagiados pelos defeitos humanos, não me abandonam em momento algum.
E assim, a vida toma cor, som, cheiro e brilho.
Tudo por causa dos meus dois anjos feitos de papel dourado...

Com o coração nas mãos, faltou-me a coragem.
Aquele adeus que eu nunca pude dar...

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Quando deixei de me importar


No momento em que tu sumistes
E me deixastes no vazio distante,
Eu deixei de me importar contigo.
Naquela tarde
Em que descobri aquilo que me escondias
Eu deixei de me importar contigo.
Quando eu precisava de ti e preferias ficar sozinho
Eu deixei de me importar contigo.
Em tantos momentos
Busquei-te no meio da multidão.
Por tantas vezes implorei através das minhas atitudes
Que tu pudesse me deixar entrar
Quando via a porta cerrada da tua vida.
No momento em que passei a me importar comigo,
Eu deixei de me importar contigo.
E neste momento tudo começou a fazer sentido. 
Com menos tu,
Mais eu,
Mais vida. 
E agora tu reclamas que eu não me importo contigo...

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Indiferença



Cansada...
Esta é a melhor palavra que poderia definir este momento sem vida, em que percebo que meu limite está rente a meus olhos e na palma da minha mão.
Não há nada mais a ser feito.
Os gritos ecoaram no meio da escuridão e no sono tranquilo que jazia sobre meus pensamentos.
Se existia alguma forma de apagar tudo e de limpar toda a mágoa que agora reside em meu peito, talvez não a quisesse.
Talvez seja neste momento que eu perceba tudo aquilo que és e toda a importância dada na razão de segundos.
Sempre ouvi dizer que a vida é feita de escolhas e aprendi a respeitá-las, no momento em que apago toda a ilusão que se criou no meio das expectativas.
Simplesmente apago as memórias vazias e, inclusive, tudo aquilo que me fez mal.
A indiferença começa a tomar forma, como já havia sido feito muitas e muitas vezes no decorrer da vida.
Em um passado nem tão distante.
Eu quis o momento, eu quis tanto, que no meio de tudo o que me rodeia neste momento em que aprendestes a ser indiferente comigo, tropeço no mesmo sentimento que aprendi a nutrir por ti.
Já não há certo e errado.
Já não há escolhas e tampouco caminhos a serem perseguidos juntos.
Lentamente tudo vai ficando turvo e já não posso mais ouvir a tua voz.
E os gritos que ecoavam no meio da escuridão, quase sem querer, afastaram-se de onde meu coração poderia tocar.
Já não te ouço e não te escuto.
Restando no meio da intesidade existente na multidão, palavras ferozes que já não podem me alcançar.
Ou quem sabe a falta delas...

Fim



Entre cacos que me ferem
Tento encontrar pedaços de mim mesma.
São tantas coisas ao meu redor
Que não me encontro em lugar algum.
Quisera ser uma só
E sendo uma, ser inteira.
Mas fiz-me pedaços de tantas
Que já não sei quem sou.
Mascaras e armaduras cobrem meu corpo
E retira-las tornou-se pesaroso
Sem forças ou sem vontade
Vou postergando a minha descoberta
O medo me assombra
De saber-me vazia quando todas
As facetas, que foi minha vida,
Quando estiver despida do que sou.
Eu sei que não sou esta que se apresenta
Diante dos olhos que me veem
Quem sou? Não sei.
Busco nos cacos, descobrir.
Quais as peças que me completam
Quais as peças que roubei
Do quebra cabeça da vida
Perdida, me vejo numa contínua busca.
Da alma que existe em mim
Coberta com a burca
Que costurei com os fios das lembranças
Maltrapilhas que acumulei no passar dos tempos
Foram traições inesperadas
Das horas que se passavam
Num embalar desafinado
Não queria estar no meu lugar
Não queria sobrepor-me a mim mesma
Era tudo tão simples
Até o momento que quebrei-me por inteiro
Para fazer de mim uma verdade
Que não consigo encontrar
Sob as máscaras e armaduras
Que me cobriram por tanto tempo
Já não lembro se um dia fui alguém
Como tantos alguéns que cruzam meu caminho
Só vejo pedaços desconexos
Que me sufocam sem me completar.

Carmen Mattos

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Elos


Tudo o que eu posso é pedir desculpas. Por não ser o planejado e por tentar carregar sozinha o peso das minhas frustrações ao invés de lhe pedir auxílio para me guiar. O que eu posso é dizer que a proporção a que tudo chegou não fazia parte dos planos e que jamais quis lhe magoar. O que sentes talvez não estivesse ao meu alcance na medida em que o que senti não estivesse ao seu. E assim, sem um compreender o outro, quebramos um elo dourado, da cor dos nossos sonhos. Errei tentando acertar, errasses tentando acertar. E nesse vai e vem de emoções e de toda a confusão que se formou, no meio de um assunto banal, talvez tenhamos perdido aquilo tudo o que nos unia. Ou talvez tenhamos aprendido a conhecer um ao outro de forma mais profunda. Talvez o que era ouro transformou-se em pó. Ou talvez a corrente que nos unia tenha virado aço, onde cada parte sabe exatamente a sua função, caminhando de mãos dadas, um segurando o outro para não ruir. Um elo sem fim, um conhecendo o outro, tornando-nos mais fortes em meio às tempestades. Onde o peso não é mais carregado por um, mas por dois que buscam o caminho do conhecimento, da aceitação, em uma evolução constante. 
E tudo o que me questiono agora é o talvez. 
Palavra meticulosamente planejada, que me deixa sem respostas suas agora. 
E enquanto espero, revivo passo a passo, lentamente, tudo que fez valer a pena.
E tudo aquilo que ainda o faz!

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Faltaram as Rosas



Ela segurou sua blusa no ar,
Olhou para trás,
Viu seu passado
E deu um sorriso radiante.
Dobrou a blusa e a pôs na mala.
Assim, peça por peça,
Foi traçando um novo futuro.
Malas feitas, cabeça erguida,
Caminhou altiva para o desconhecido.
Chegou numa bonita casa
E logo começou a transforma-la num lar.
Trabalhava sem parar,
Eram pequenos detalhes
A darem vida na sua vida.
Nunca parou até perceber,
Que não havia mais paredes,
Para enfeitar.
Que não havia mais música,
Para ouvir.
Que não havia mais palavras doces,
Para lhe embalar.
Quando foi a última vez que recebera um presente
Sem quê nem pra quê?
Quando foi a última vez que abraçara
Um buquê de rosas?
Quando foi a última vez que uma mão
Procurara a sua espontaneamente.
Ela segurou sua blusa no ar,
Olhou para trás,
Viu seu passado, 
E deu um sorrido triste,
Dobrou a blusa e a pôs na mala.

Carmen Mattos

Não esperes


Não esperes que eu compreenda tudo, tão de repente.
Não esperes que eu aceite tudo, tão de repente.
Há muitos caminhos andados e muitas histórias de vida para absorver. 
Não esperes que tua honestidade hostil não deixe marcas enquanto te escuto falar daquilo que tampouco me agrada.
Não esperes uma palavra amiga e nem tempestades, enquanto tudo o que preciso é tempo para respirar e deixar a mente pedir calma.
Não esperes que quando eu leio tudo o que leio, vejo tudo o que vejo e escuto de ti, não tenha dúvidas de onde deveria estar.
Neste momento, enquanto a mente trabalha absorvendo teu passado, não esperes carinho e compreensão,   raiva ou rancor.
Simplesmente não espere nada além de tempo.
Teu passado intenso demais me assusta e assombra na medida em que tudo o que leio compactua com tuas palavras.
Só te peço isso...
Não esperes...
Porque de tanto esperar, vi-me dentre palavras desagradáveis, que só o tempo poderá curar.
Por isto, meu amigo, o que só posso te pedir depois que as cartas foram jogadas à mesa é que não esperes. 
Porque quando te ofereci ajuda sincera, fui de peito aberto, e a negativa de tuas palavras refletiram que teu passado anda de mãos dadas com o futuro e com o presente.
Eu já aprendi a não esperar nada, além de palavras que podem me machucar.
Simplesmente não esperes, porque eu já deixei de esperar...

sábado, 10 de janeiro de 2015

As horas




Mãos atadas no meio da escuridão que ilumina meu quarto tão sem vida. 
Já não existem pensamentos que residam nesse vão que se formou dentro de mim mesma.
Imersa nesse vazio que se formou e em todas as vezes que acreditei que pudesse escapar, fixo o olhar no peito que sangra.
Toda a dor que peguei para mim para não ver você sofrer, subitamente transborda meu corpo em chamas e se transforma em lágrimas que apagam tudo o que pudesse sentir.
Eu havi pedido tão pouco e me perdido na ilusão de que era suficiente.
Eu havia esperado muito, que o relógio já pulsava em uma triste melodia em que segundos se transformavam em horas.
Havia tanto ainda a ser feito, tanto a ser construído, tanto a ser consertado...
Já não existem razões para que minhas mãos se desatem e tampouco vontade para que isso aconteça.
Simplesmente me entreguei.
Eu, o escuro do quarto, o teto, as paredes e esse velho relógio que sufoca toda a necessidade de ver as horas passarem nesse momento de embriaguez...


sexta-feira, 9 de janeiro de 2015





Enquanto jazes sobre a cama mal feita, no meio de sonhos confusos que lhe atormentam a mente, respiras fundo e pensas naquilo que lhe tira o fôlego todos os dias ao acordar e antes de dormir.
Lembras dos sonhos desfeitos e de todas as lágrimas que foram secando com o tempo, tornando-lhe fria como forma de proteção.
Escondida, está toda a sua perfeição e aquilo que mostras aos poucos que habitam a sua alma com momentos bons de pura entregação.
A imagem que reflete ao mundo seria tão diferente daquela que carregas consigo?
Questionando-se sobre todos os passos mal dados que lhe conduziram até esse momento, a gratidão lhe domina e percebes que tudo fora meticulosamente planejado.
Seria esse um golpe do Destino?
E assim, no meio desses versos sem fim, percebes que mesmo que algum dia haja um fim na folha do papel, jamais se esquecerás do dia em que seu mundo parou para que um novo ser pudesse ser construído dentro de si...

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Quem Sabe




Eu sempre disse que tinha mil defeitos, na mesma proporção de qualidades. Eu sempre disse que havia aprendido a viver só e que só entraria em meu mundo quem fizesse meu coração parar e saber que valesse a pena. 
E assim, de mansinho, chegastes e arrancastes sorrisos, esperanças e brilho nos olhos. 
Gostava exatamente daquilo que eras, até que me deparei com uma indiferença que, até então, não sabia que pudesse vir de ti.
Escutei tuas palavras hostis e quietinha, engoli-as como se fossem minhas e te escondi a verdade, com medo de ser mal interpretada, mais uma vez.
Escondi de ti o quanto havia me decepcionado e o quanto tudo parou de fazer sentido, tão de repente.
Tornei a tua indiferença minha e andei nos mesmos velhos conhecidos passos.
Era boa na arte do desapego e, com base nas tuas palavras, deixei-te ir.
Sem perguntas, sem respostas, sem explicações.
Apenas te deixei caminhar rumo ao teu caminho, teu Destino, teu porto seguro.
Deixei-te voar alto para, quem sabe, um dia voltares, apagando todas as palavras que deixastes pelo caminho...

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

ZACK E JOAQUIM


Bolinha, menina assanhada do interior de Goiás,
Com pai e mãe desconhecidos,
Um dia chegou por lá e foi ficando.
Senhorzinho, homem da cidade,
Num dia qualquer do mês de outubro de 2004,
Foi ver suas terras, sua casa, seu descanso.
Chegando por lá, veio depressa o ofegante caseiro.
A lhe dizer: Bolinha deu cria, mas não preocupa não.
Tenho lugar para lhes espalhar.
O homem foi ver os bichinhos recém-nascidos
Eram tantos, de tantas cores.
Que chegou a estontear.
Mas logo seus olhos viram, 
Um pequeno muito engraçado
Tinha metade da cara branca e a outra bem preta
Tinha, também, no lombo negro, um Z bem desenhado.
Olhou mais de perto, e seus olhos se encontraram.
Olho no olho, uma magia se formou.
Ele virou-se para o empregado e falou:
Esse não, esse vai ficar comigo.
E com esse Z das suas costas, vou escrever Zack.
Passadas algumas semanas, Sinhozinho voltou.
Pegou Zack pela nuca e viu o que o bicho
Era um emaranhado de pulgas a balançar o rabo.
Mas a decisão já estava tomada e Zack ia para a cidade
Eram tantos pontinhos pretos pulantes
Que o pequeno teve que viajar na carroceria.
No meio do caminho, parou numa venda.
Para perguntar como fazer para curar o bichano
Põe-lhe Bofo, disseram-lhe, depois de 1 hora dê um banho.
Fica garantido que não fica uma só vivinha.
Assim fez, Sinhozinho e na verdade ficou nenhuma não.
Zack, cachorro da roça, não foi bem aceito na cidade.
Seu “pai” salvou-lhe a vida várias vezes.
Era determinado e queria aquele cão.
E Zack soube que ele lhe queria
E lembrou-se da primeira vez que se olharam
E o homem soube que ele lhe queria
E lembrou-se da primeira vez que se olharam.
Assim se passaram 10 anos.
Para onde o homem olhava, estava Zack.
Para onde Zack olhava, estava o Sinhozinho.
Esbarravam-se a toda hora, se achavam e se perdiam.
Mas quem quisesse procurar por um, bastava procurar o outro.
Foi aí que no dia 18 de dezembro de 2014
Sinhozinho chegou e Zack não correu ao seu encontro.
Meio ressabiado, Sinhozinho saiu a sua procura.
Encontrou-o cabisbaixo, andando com dificuldade.
Mal conseguindo lhe abanar o rabo.
Parecia estar envergonhado de não conseguir lhe fazer festa.
Sinhozinho abraçou-o apertado e com o coração
Disse-lhe: Tudo bem amigo, vamos ao médico,
Você vai ficar bom, pois temos muito caminho a percorrer.
A volta para casa, foi silenciosa.
Sinhozinho teria que andar sozinho, pois seu companheiro.
Já não tinha mais forças. Suas pernas longas estavam frágeis
Nem mesmo, seu delgado corpo conseguia aguentar.
Olharam-se nos olhos, mais uma vez.
E Zack viu lágrimas nos olhos de seu protetor.
Mas estava reconfortado, pois ele ficou ao seu lado.
Mesmo o vendo definhar, sem abanar o rabo. 
Ou segui-lo por onde fosse.
Sombra do que um dia fora, o amor se intensificava.
Que hora boba de morrer, Zack!
Nós não tínhamos combinado isso!
Você não me preparou.
Você não ficou doente.
Você somente foi sumindo,
Pensava Sinhozinho.
E entre lágrimas e uma dor intensa.
Sinhozinho ficou a acariciar
Aquele que foi seu amigo e companheiro
Desde que trocaram o primeiro olhar
Já passados 10 anos.

Carmen Mattos

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